sexta-feira, 29 de março de 2013

Entrevista: Flavio Corrêa de Mello

 Esta semana contei na fanpage do blog que teríamos novidades. Seguindo a linha "devo não nego, pago quando puder", aqui estou com a tão esperada inovação. Vou começar a postar, às quartas (estou um pouco atrasada), entrevistas com pessoas do meio literário. 
 Essa semana o entrevistado é o escritor e professor carioca Flávio Corrêa de Mello, que acaba de lançar seu segundo livro, Rio Movediço, publicado pela Editora Verve.
  À entrevista!





 1- De onde surgiu seu interesse pela literatura?
 O interesse pela literatura surgiu desde que juntei a + b e assim por diante. Já criança e adolescente cultivava o hábito de leitura. Fui estimulado a ler por meus pais.Também tive professores que me incentivavam muito e depois engrenei naturalmente.  Aos poucos fui desenvolvendo o hábito de anotar impressões literárias nos cadernos.
Mas a escrita criativa e o hábito de escrever poemas despertaram mesmo na universidade, no curso de letras, até então eu lia somente muita prosa. Em 1994 ou 1995, fiz uma oficina literária com o escritor João Gilberto Noll na UERJ. Ali naquele ambiente de troca literária comecei a produzir meus primeiros escritos. 

 2- Em que momento da sua vida você pensou: "É isso que quero fazer mesmo"?
 Foi um processo gradual, na verdade ainda é... Escrevo porque sinto uma coceira no cérebro de contar alguma história ou algum verso que amadurece. Escrevo naturalmente porque leio.
Em alguns momentos, pensei somente em escrever ou apenas parar tudo na vida para fazer literatura, mas a vida foi me apresentando situações novas e hoje penso de modo um pouco diferente. Além de produzir meus textos, construí uma história pessoal que me permite militar na área da literatura.
Por formação sou professor e já tem uns quinze anos que trabalho com livros e educação. Isso  me ajuda bastante a desenvolver um tipo de escuta que levo para a sala de aula quando leciono literatura e oficinas de escrita criativa.
Além de escrever faço outras coisas associadas à literatura e à leitura, quero fazer outras pessoas lerem mais, escreverem mais. Nos meus trabalhos procuro desenvolver conceitos e metodologias que entrelacem a produção de uma memória individual, local, geográfica, associadas à criação artística propriamente dita. A história fatual, a história consolidada em documentos não leva em conta os aspectos do quotidiano nem as paixões de indivíduos. É justamente aí que encontro uma matéria que pode ser reinventada literariamente, mas que contém substratos comuns aos membros de uma mesma comunidade. Isso me interessa muito do ponto de vista criativo, pois estimula um contato mais íntimo com a literatura, principalmente com estudantes e jovens escritores.

 3- O que você acha que um escritor precisa ter?
Em primeiro lugar, vale ressaltar que a literatura não é algo que está distante de nenhum indivíduo. Não é uma arte somente para eleitos dotados de um caráter divino-artístico, está ao alcance e é um patrimônio de todos. Para isto basta apenas saber ler. Na verdade, um escritor precisa ler, ler e ler. Ler bons livros e aguçar os olhos não apenas com deleite ou simples entretenimento.
Precisa escrever né? E também reescrever bastante o que foi produzido para mensurar o seu nível de qualidade textual e o que ele valoriza na sua escrita. É como um pintor que, por exemplo, começa com o esboço do que irá pintar. Tem de treinar a mão, fazer os devidos aquecimentos de escrita e criar suas técnicas internas que vão se desenvolvendo ao longo do tempo. Portanto, escrever é algo para a vida toda.
Sabe a metáfora do vinho, aquela que diz que quanto mais velho melhor... Eu prefiro a da água... Quando se trata de criação. Quanto mais o escritor escreve, mais seu texto flui. Quanto mais ele se conhece, embora o autoconhecimento pleno seja muito perigoso, acredito, mais ele se aproxima da sua fonte de criação, de suas fontes minerais, mais próximo ele estará dos sentimentos que serão impressos no texto. A esses sentimentos se aliam o artífice e a técnica, pois arte é técnica mesmo.
Também precisa ser lido e confrontado com o seu leitor e constituir a estima que o leve adiante quando o seu texto não for bem recebido. Por consequência, desenvolver a aceitação para com as críticas que advém da exposição do seu texto.
 Um escritor em tempos atuais tem de se divulgar. Digo isso, porque foi o que me disseram outro dia os amigos Raphael Vidal e Ecio Salles, um no almoço, outro no café. E isso é verdade... Em tempos contemporâneos, um escritor que não se divulga e que ainda fica a espera de seu leitor de modo romântico, tende muito a amargura e ao ressentimento. Isso envenena seu trabalho e a pessoa se torna chata demais. Mas veja bem, isso não quer dizer que o escritor não possa ser uma pessoa reservada.

 4- Quais livros você anda lendo?
Leio vários ao mesmo tempo. Estou lendo o tempo vivo da memória, da Ecléa Bosi, as feras, do Roberto Arlt e Ou o poema contínuo do Herberto Helder.

5- Como você foi parar na Suíça?
Longa história e boa para um café. Estava sem perspectivas por aqui e ansioso por mudanças. Foi aventura total.  

 6- A experiência mudou seu jeito de escrever?
 Sim. Mudou muito. Lá eu escrevi o Poemas Suíços, que depois veio a ser publicado. Foi minha estreia. Ali, eu comecei a pinçar os meus conceitos de poemas sobre as cidades. É uma ideia de fazer radiografias íntimas de sentimentos comuns a todos e inventariar uma memória local. São como cadernos de viagens, cadernos literários. A partir deste livro surgiram os primeiros insights de mecanismos que uso para nos encontros literários: os exercícios de observação, os poemas que se confundem com prosa, para que possuem apelo mais narrativo, mas com os recursos metafóricos, sinestésicos. A construção do conto, tudo foi surgindo naquela experiência.

7- Sobre o Rio Movediço: Eu e minha avó amamos o livro, como você já sabe. Qual era a sua intenção com esse livro no quesito sentimento? Pois ele realmente me fez refletir muito. Eu o achei muito visceral. Era isso que você queria atingir?
Não sei se é visceral ou não... E definitivamente não queria atingir isso. Sabe! Eu escrevi e reescrevi o Rio Movediço ao longo de seis anos no mínimo. É um bom livro, melhor que o primeiro. Disso eu não tenho dúvidas, está mais acabado, mais redondo por assim dizer.
Rio Movediço foi o título da coluna que escrevia para o site Bagatelas em 2006 e depois virou o título do meu blog. Mas não é um blog que virou um livro, pois o movimento foi ao contrário, do livro surgiu o blog, só que o livro demorou a sair. Rio é a cidade, é o movimento fluido de ritmos de cores e sentimentos, é líquido. A separação de duas terras, dois corpos. Procurei equilibrar ao longo dos poemas os recursos de som, imagem e pensamento, algumas vezes de maneira intuitiva, outras vezes de maneira bem racional.
Mas fico feliz que você tenha sentido os poemas desse modo. Fico muito feliz de saber que ele agradou a você e a sua avó. Afinal são duas gerações diferentes, com experiências de vida completamente diferentes.  

8- A poesia é o seu lar?
Por enquanto a poesia e o conto e ensaios e artigos. A poesia e o conto são duas artes muito difíceis de fazer, acredito. Só que as duas artes primam pela concisão, mais o conto inclusive.
  
 9- Um conselho para os novos escritores:
Escreva sempre pensando na qualidade, leia bons escritores e escreva sem medo. Troque, tenha amigos que gostam de escrever também. Se interesse pelo que acontece em sua volta, isso é bom. Por último, o escritor deve fazer sua parte sem ter em mente o que o leitor vai pensar. O resultado é uma consequência de trabalho e que não é necessariamente o que projetamos ou idealizamos.

10- Como é o seu café?
Matutino. Muito café e um pinguinho de leite para dar “sustância”.


Obrigada Flavio, pela entrevista!
Você pode comprar o livro Rio Movediço aqui!


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