quarta-feira, 22 de maio de 2013

Entrevista: Thereza Christina Rocque da Motta




Há dois anos atrás conheci Thereza no Corujão da Poesia, que ainda acontecia no Catete. Foi o evento da minha vida e também um grande acontecimento. Lembro que na época já estava para lançar o Demasias, que devido ao medo desisti de forma magistral. Mesmo assim naquele dia travei uma conversa rápida com Thereza e ela foi muito gentil e solícita com aquela pequena escritora excessivamente efusiva e produzida para o evento. No mesmo dia a adicionei no Facebook.
Dois anos depois, menos efusiva porém igualmente medrosa pedi que ela concedesse esta entrevista para meu tão querido blog e para minha alegria ela, muito solícita, concordou.
Então, queridos amigos, tenho o enorme prazer de dividir com vocês essa entrevista maravilhosa. Mas primei vamos às apresentações:

Thereza nasceu em São Paulo e logo foi passear: Boston, Assunção e Montevidéu. Aos cinco anos veio para o Rio e aqui ficou até os dezoito, com essa idade foi para São Paulo de novo. Fez vestibular para direito na faculdade Mackenzie, onde foi convidada para fazer parte da redação do jornal Análise do DCE da Universidade. Devido aos poemas que ali publicava fundou um grupo de poetas mackenzistas.
O primeiro livro veio em 1980. Porém o início da carreira profissional, em 81, estancou o processo criativo.  Só em 92 Thereza retoma a publicação de livros porque “parar de escrever eu nunca parei”. Em 99 ela retorna ao Rio e ao ver eventos de poesia em franca atividade, funda um grupo de poeta, os Descaravelados.
No ano 2000 lança a editora Ibis Libris, da qual hoje é sócia diretora.

À entrevista!



1- Com dezesseis anos você ganhou um concurso de literatura no colégio. Escrever é se expor, colocar seus sentimentos, de onde você tirou a coragem de ler suas poesias para um public sendo tão nova?
A coragem vem da própria poesia que quer ser dita. Independe de coragem, eu era tímida, mas gostava de escrever e mostrar o que se escreve faz parte do processo de amadurecimento do autor.

2- Hilda Hilst parece ter sido uma pessoa importante na sua história e na sua carreira. O que ela te ensinou que você pode passar para os novos escritores?
Foi porque ela desde cedo, quando eu tinha 19 anos, deu seu aval à minha poesia. Disse que eu “estava no caminho certo” e que iria encontrar o meu caminho sozinha. Ela me ensinou pelo exemplo, através de sua própria poesia. Hilda é uma das maiores poetas brasileiras. Sua poesia é incomparável, bem como sua perspicácia e astúcia para escrever, além do burilar de palavras. Seus poemas são grandiosos. A poesia de Hilda me faz escrever, provoca poemas, e só um bom poeta consegue isso. Hilda me disse para ousar, e foi o que eu fiz, por sua postura diante de sua obra. Ela se pôs a escrever, empenhou-se nisso, dedicou a vida inteira à literatura, disse que tinha muito a escrever e pouco tempo e fez isso por mais de 30 anos sem parar. E, apesar disso, estava desgostosa com o pouco reconhecimento. Até aventurar-se em dizer que deveríamos escrever em inglês, “porque ninguém lê português”. E por isso passei a verter meus poemas e depois a escrever direto em inglês, graças a esta sugestão dela. Este é meu conselho para novos autores. 

3- A escrita é, na minha opinião, algo muito pessoal e íntimo. você acha que de certa forma os escritores precisam ser, no sentido literal, "sem vergonha"?
A escrita é íntima, o ato de escrever, solitário, mas é preciso ter coragem até para escrever, não ter pudor de se expor, pois ao escrever, alguém poderá ler, e isso é perder a vergonha de dizer o que pensa e sente.

4 - Uma vez me disseram que livros são como filhos. Tem como escolher um favorito entre os livros que você já escreveu?
Publiquei 13 livros. Não tenho um favorito e livros não são como filhos, são muito mais, porque fazem por nós o que os filhos não fazem. Os livros são para sempre e vão falar de nós, vão levar o que pensamos adiante. Nenhum filho faz isso. Filhos quer que façam por eles. O livro faz por nós o que só ele poderia fazer, leva-nos a toda parte, mostrando o que escrevemos. Livros não são filhos, embora sejam criados por nós, eles nos precedem e nos sucedem, pois um livro fala por si só o que ele quer dizer, e nós só o conduzimos e o trazemos a lume. Se tivesse de escolher um (coisa mais difícil) escolheria o primeiro, Joio & Trigo, que foi o livro que me abriu todas as portas, e definiu o que eu escrevia, o meu estilo, e começou a fala que continua em todos os livros escritos depois. Sem o primeiro livro não é possível chegar ao 13º.

4- Qual é a sua visão do mundo editorial hoje em dia estando dentro dele?
É um balaio de gatos. Aqui todo mundo quer levar vantagem, sempre. Não há condições ideais para se publicar, mas se continua publicando mesmo assim. Não há outro modo de mostrar o que se escreve, mas como fazer esses livros circularem é um funil e uma caixa de Pandora. Nunca se sabe se vai dar certo. Apostar em livros é 50% de sorte e 50% de trabalho. Mas basta 1% disso não acontecer que o livro será um fracasso. Temos de estar à altura da demanda, não adianta publicar e não poder atender o mercado e não se consegue atender o mercado com algo que ele não quer. É um jogo de azar e muito dinheiro. Quem tem dinheiro e sabe aplicar, ganha. E quem não tem, precisa ter mais sorte e competência ainda. 
5- Eventos como o Corujão da Poesia deveriam ser mais divulgados. Na sua opinião, o que faz com que encontros assim sejam pouco divulgados pela mídia? 
Os eventos como o Corujão da Poesia e a Ponte de Versos são bem divulgados, mas não ganham a grande mídia porque só se aposta em celebridades. E nem todas as celebridades estão nesses eventos. É um lugar de iniciantes e veteranos se ombrearem por um lugar ao sol da poesia. Ali um poema vale tudo. Se um ator global for ler um poema, ele ganha mídia e o evento também. Mas se o ator não estiver no evento, o evento vale o poema que for lido. E a imprensa está preocupada em vender notícia. Esses eventos sobrevivem da constância semanal ou quinzenal de seus organizadores. Se não estivermos lá à disposição o público dispersa e irá procurar outro lugar – ele vive e sobrevive de poesia, não de mídia. E quem o frequenta não troca isso por nada. A Ponte de Versos tem 14 anos e o Corujão da Poesia, oito. A Ponte de Versos só existe ainda porque eu continuo realizando o evento apesar de todas as intempéries, e porque existe um público do evento. O Corujão é um evento patrocinado por uma universidade e alcança mais mídia porque existe um trabalho nesse sentido. Mas há muito mais do que esses dois eventos no Rio de Janeiro, São Paulo, Sul e NE do Brasil.

6- Um livro que você recomenda para jovens confusos:
Confusos? Em saber o que é literatura? Leiam os grandes escritores. Brasileiros e estrangeiros. Mergulhem de cabeça na literatura, e leiam tudo que gostarem, quiserem e que lhe cair nas mãos. Literatura é hábito, e é preciso descobrir seu gosto pessoal. Não se indica um livro apenas. Eu li Clarice Lispector aos 15 anos e abriu minha cabeça, nunca mais eu fui a mesma. Eu li Machado de Assis, Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Cecília Meireles, Vinicius de Moraes, José Lins do Rêgo. É preciso ler os autores brasileiros como Monteiro Lobato, Fernando Sabino, José de Alencar. É preciso descobrir o que se gosta de ler, para começar e não parar mais. Leiam boas traduções de autores estrangeiros: Proust, Dickens, Oscar Wilde, T. S. Eliot, Baudelaire, Rimbaud, o que quiserem. Autores russos, franceses, italianos, portugueses, espanhóis, árabes. Literatura é universal. Um bom livro acaba com qualquer confusão. Seja pessoal ou não.

7- O que você considera um resultado desastroso?
Em literatura? Tudo que não tiver qualidade.

Pergunta nada a ver: Qual a sua banda de rock favorita?
Beatles 4 EVER.


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