Parte 1
Toda
vez que ela olhava para um papel em branco a ideia de escrever vinha à sua
cabeça. Mas quem leria coisas tão simples e mal descritas? Essa era a dúvida
que assombrava a mente de Olivia.
Olivia.
Menina quase crescida com muito na cabeça e pouco no olhar, ou até demais no
olhar, isso era uma questão de ponto de vista. Tudo parecia se virar à sua
volta e ela, pobre menina quase crescida, se via parada. Ponto de vista. Afinal
à nossa volta tudo se move mas nós, estando em nossos corpos e com nossos olhos,
estamos parados. Mas a sensação de estagnação que parecia mata-la. Correr como
maratonista em uma esteira, o simples fato de andar muito e chegar à lugar
nenhum. Sim, Olivia sentia grande dor de ficar presa ao chão, mas não seria
esse o fardo da sua geração?
Era
um dia claro, o sol invadia suas pálpebras fechadas e tornava as cortinas
brancas inúteis. Seguindo sua rotina tediosa Olivia fez o de costume. Sua vida
certamente não era um dos filmes que tanto adorava. Essa menina não era nenhuma
Amelie Poulain. Era rica, de cultura e de dinheiro, mas não era a mulher
sofisticada, importante e profunda que desejava. A menina quase crescida estava vivendo uma
fase de férias permanentes desde que passou para a faculdade de Direito que os
pais tanto sonhavam e trancou sua matrícula para “descobrir o que a vida
poderia apresentar-lhe”. Tinha poucos amigos então passava muito tempo sozinha
no lugar que ela fez o mundo: seu apartamento. Um imóvel dos pais que não era
alugado há alguns anos, todos sabem bem quanto custa viver no Rio de Janeiro
hoje em dia. Demais.
Olivia
fazia do nada tudo. Era seu tempo de reflexão. Era para ser um tempo de
reflexão, mas, na verdade era tempo de dançar sozinha na sala de estar, passear
com o cachorro e ver séries e novelas pensando como seria o mundo lá fora, como
seria sua vida lá fora. Talvez a menina não fosse tão rica de cultura como
aparentava. Com seus dezenove anos ela tinha tudo que alguém poderia querer,
poderia ter qualquer coisa material que quisesse, se não fosse uma grande extravagancia
afinal seus pais ainda tinham que educa-la, mas sentia não ter nada. O que
tinha, com certeza absoluta, era a sensação de ser apenas matéria. A sensação
dos pobres jovens ricos da ausência total e absoluta de alma e motivo.
À
noite Olivia se chateava. Toda noite Olivia olhava pela janela, ouvindo a rua,
fechava os olhos e se colocava na pele de outros. “São uns imbecis, estúpidos”
mas como queria ser estúpida como eles. Seu pai costumava falar que gostaria de
ser mais ignorante pois assim seria mais fácil ser feliz. Uma dose de
ignorância torna a vida mais fácil. Pensar em como deixar a bunda dura até os
cinquenta e qual cumprimento de roupa separa o sexy do vulgar ao invés de
pensar incessantemente nos dilemas do universo deve facilitar a vida de
qualquer um. A não ser que bunda caída se torne um dilema tão profundo que
ocupe todo o espaço e tempo que o cérebro tem disponível. Ainda sim, são
maneiras de enxergar o mundo.
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